20 novembro 2006

Temas em debate: condenação criminal do empregado como justa causa para a despedida do empregado


CLT – Art. 482, "d." Dignidade da pessoa humana. Fundamento da Pena. “Bis in idem”

Icaro Duarte

Dispõe a CLT, em seu artigo 482, d, que a condenação criminal do empregado, passado em julgado, caracteriza, ou melhor, tipifica causa de resolução contratual, isto é, justa causa para a despedida.

Mas, fazendo-se uma análise mais profunda, verificar-se-á que tal disposição é uma crueldade, um atentado contra a dignidade da pessoa humana, além de ser contrária ao escopo da pena e, em razão disso, acaba se tornando uma segunda condenação para o mesmo fato.

Quanto ao primeiro ponto, ou seja, a dignidade da pessoa humana, tal permissivo supracitado fere o que o homem erigiu ao topo da pirâmide de Direitos e Garantias; fere, exatamente, por vir em um momento em que o indivíduo está humilhado perante a sociedade, por ter sido condenado na esfera criminal.

Devido a essa condenação, o indivíduo perde o respeito da sociedade, dos amigos e, muitas vezes, de seus próprios familiares. É uma situação onde o cidadão se encontra no fundo do poço e, para completar sua desgraça, perde o fio de esperança onde poderia se sustentar que é o seu emprego. Pior, sem direito às indenizações que lhe seriam devidas caso houvesse sido despedido sem justa causa.

Por isso, torna-se claro, como um dia ensolarado que este dispositivo da CLT fere de morte o tão aclamado Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

Por conseguinte, há o fundamento de que a pena tem como finalidade evitar novos delitos, isto é, no sistema pátrio a pena tem natureza mista. Assim, a pena é retributiva e preventiva, ou seja, a pena é a ameaça de um mal contra o autor da infração penal e é, também, um meio que visa a evitar a prática de novas infrações. Além destes, possui, igualmente, caráter sociológico de ressocializar o sujeito do crime.

Para que se desperte no infrator essa censura e a “não-vontade” ou “não-necessidade” de voltar a cometer um delito, aquele precisa de esperança e expectativa. Ora, um cidadão que é condenado e humilhado perante a sociedade precisa de algo para se apoiar, e esse algo é justamente o seu emprego, que lhe dá dignidade, ajuda no seu sustento e de sua família, além de afastá-lo da possível prática de delitos.

Entretanto, a CLT, ao permitir que a condenação, passado em julgado, seja justa causa para a despedida, faz com que caia por terra todo o objetivo ressocializador da pena, justamente por arrancar a esperança que o condenado teria de que ao ser libertado, teria seu emprego de volta. Além disso, buscaria um bom comportamento no cumprimento da pena.

Ademais, a norma contida no art. 482, “d”, pode ser vista como um “bis in idem”, pois, além da condenação penal, o sujeito recebe outra condenação no âmbito trabalhista. Condenação esta equivalente a uma pena de morte, haja vista o Brasil não oferecer a quantidade suficiente de emprego e o preconceito que há de se empregar um ex-presidiário.

Tudo isto é para se chegar a uma situação, ou melhor, a uma alternativa, qual seja, a de que a tipificação para despedida com justa causa contida no Art. 482, “d”, não seja caso de extinção, ou como prefere a CLT, de rescisão contratual e sim de suspensão do contrato. Portanto, tal hipótese deveria figurar no Capítulo IV, Título IV da CLT.

Sendo causa de suspensão do contrato de trabalho, a condenação, passada em julgado, seria muito mais benéfica para o trabalhador e para a sociedade, visto que, não feriria a dignidade da pessoa humana do trabalhador, já “mortalmente” ferido pela condenação criminal; serviria como um apoio para o obreiro-condenado enquanto do cumprimento da pena, fazendo com que este tenha bom comportamento e enxergue um futuro para o momento da saída da prisão; fica em harmonia com o princípio ressocializador da pena; e, não condena o sujeito mais uma vez.

Destarte, para o bem da sociedade e do trabalhador em questão, prega-se, aqui, seja a condenação, passada em julgado, não mais tida como hipótese de justa causa, mas, sim, de suspensão do contrato de trabalho, observando-se, desta forma, o Princípio da Proteção do Trabalhador e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.